quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Por uma Teologia menos medrosa

Os números não mentem, mas por vezes, enganam. O Brasil, que até a década de 80 tinha mais de 81% da sua população católica, viveu nos últimos 30 anos uma transformação cultural sem paralelo em nenhuma outra nação do mundo moderno. O IBGE aponta que os evangélicos de todas as confissões, saltaram de 15,4% da população em 2000, para 22,2% em 2010. Em números totais, passamos de 26 milhões para 42 milhões, numa população de 200 milhões de habitantes. E as principais responsáveis por esta expansão do protestantismo brasileiro, tem sido as igrejas pentecostais (Assembleia de Deus,Igreja Quadrangular, Brasil para Cristo, etc) e as neopentecostais (Universal, Internacional da Graça, Mundial, etc). No entanto, este crescimento vem acompanhado de um paradoxo: por um lado, igrejas vibrantes e em expansão, e por outro, formação deficiente e em declínio, tanto na liderança como no discipulado cristão. Na denominação a que pertenço (Igreja do Evangelho Quadrangular), que tem uma cultura muito consistente de acompanhamento e coleta dedados, há um que considero preocupante: na década de 80, quando o número de evangélicos era bem menor, cerca de 20% dos membros da igreja eram assíduos freqüentadores da Escola Bíblica, valioso instrumento de discipulado cristão. Atualmente, a média não ultrapassa os 8%. E no que diz respeito à formação da liderança, a situação ganha contornos mais graves, já que a Teologia – Ciência de Estudos da Fé e da Religião – É,provavelmente, a ciência menos prestigiada do mundo acadêmico. Tanto assim é que pastores que buscam prestígio no mundo secular, tem certa vergonha de dizer que são formados apenas emTeologia (quando são), e buscam a Sociologia, Filosofia ou Psicologia. As próprias discussões teológicas da atualidade são mais sujeitas a filósofos seculares – Marx, Nietsche e Freud – do que a teólogos de fato. Precisamos, cada vez mais, de Teologia, com “t” maiúsculo. Porque a Teologia, em termos de reflexão sobre a condição humana, é tão rica em material e contribuição quanto a Psicologia e outros ramos de conhecimento. Agostinho de Hipona, Tomás de Aquino, Theodor Beza, Schleiermacher, sem falar nos inevitáveis Lutero, Calvino e Armínio – tem muito a dizer sobre o ser humano de hoje, e isso é material teológico, não de psicanálise ou filosofia. Além disso, a Teologia precisa afirmar suas convicções com clareza. Hoje em dia, apesar de os ramos do Protestantismo brasileiro que mais crescem serem os pentecostais – de tradição arminiana – cada vez mais os institutos e seminários destas igrejas são invadidos por literatura claramente calvinista. Há bem pouco tempo, quem quisesse ser professor no ITQ – Instituto Teológico Quadrangular – deveria entregar à supervisão pedagógica uma resenha da obra “Crer é Também Pensar”, de John Stott. Excelente obra, diga-se de passagem, mas toda ela eivada de um pensamento calvinista roxo. E outros autores como John Piper, D.A. Carson, são lidos nos seminários pentecostais sem maiores questionamentos. Um crescimento robusto da igreja brasileira, deve passar pelo surgimento de pesquisadores corajosos, cristãos que ingressem com firmeza e curiosidade investigativa no meio acadêmico, para produzir - e não somente reproduzir – conhecimento. Enfim, uma Teologia que não tenha medo de dizer seu nome, e afirmar com clareza a que veio, pode ser o tipo de contribuição que a sociedade brasileira anseia dessa igreja que cresce, sem dizer exatamente que valores, que legado, quer deixar na estrutura de pensamento da nossa nação e nosso povo.