quarta-feira, 27 de julho de 2011

O "Professor" de Jesus


Pintura "Salomé com a cabeça de João Batista", Caravaggio, 1607 - National Gallery, Londres

“Entre os nascidos de mulher, não há maior profeta que João Batista” (Lucas 7:28);

Uma das passagens dos Evangelhos que mais me emociona é o trecho de Mateus 11, em que discípulos enviados por João Batista questionam Jesus sobre se realmente ele era o Messias prometido ou se deveriam esperar algum outro. Após respondê-los que “os cegos vêem, os coxos andam, os paralíticos são levantados e aos pobres é anunciado o Evangelho”, Jesus inicia um discurso profundamente elogioso, emocionado mesmo, sobre João Batista. Para quem lê a Bíblia com os olhos de um cristão, trata-se de um fato nada desprezível ser digno de menção pelo próprio Filho de Deus.
A narrativa dos Evangelhos é bastante elíptica, com frases curtas, bem ao estilo da antiga literatura judaica, e por isso muita gente que lê os textos apressadamente pensa que João Batista apenas batizou Jesus, e pronto. No entanto, Joao Batista foi, por muitos anos, um importante profeta, que apesar de vestir-se mal e ter hábitos estranhos, levava multidões ao deserto para ouvi-lo, gente que percebia a bênção de Deus sobre sua vida. Uma dessas pessoas foi o próprio Cristo, de quem o profeta tornou-se uma espécie de mentor, de professor, alguém que lhe “preparou o caminho”. O próprio Jesus deixa isso bastante claro quando os fariseus lhe perguntam de quem ele havia recebido autoridade para pregar, e Jesus declara que foi através do Batismo de João Batista.
Depois de batizar Jesus, João Batista continuou arrebanhando discípulos e pregando o arrependimento. Muitos deles apenas tinham ouvido falar de Jesus, e tinham muitas dúvidas. João Batista sabia que, para estes, não bastava apenas argumentar. Por isso João mandou que fossem até Jesus, para que vissem com seus próprios olhos.
Mais do que crer em Deus, o que precisamos verdadeiramente é ter um encontro pessoal, uma experiência com Ele. Muitos que afirmam crer em Deus crêem apenas por uma convenção social, mas não têm, de fato, uma experiência pessoal com Ele. João Batista compreende esta necessidade, e num gesto de grandeza de quem não tem receios autoritários quanto a seus discípulos, manda-os até Jesus, que não precisou defender com palavras sua condição de Messias: os milagres, os frutos, falavam por si mesmo. Joao Batista estava preso porque tinha desafiado o rei ao denunciar seu pecado de adultério. Mesmo assim, Jesus exaltou a grandeza de João Batista, o precursor de seu ministério. Fala com carinho sobre o primo e preceptor, com a grandeza de quem não veio para desconstruir o passado, mas para ajustá-lo à perspectiva do presente. Fez isso de maneira absolutamente coerente com o que disse no Sermão do Monte: “Não vim para revogar a lei, mas para cumprir”.
Por isso, sempre desconfio de todo tipo de “movimento salvacionista” que surge criticando tudo o que existiu antes e se apresentando, sem modéstia, como “os únicos portadores da verdade”. Este tipo de comportamento deve ser sempre vigiado de perto, seja no campo da fé, da política, das ciências... qualquer um que chega com aquele discurso de “nunca antes na história deste país...” Cuidado. Se for na igreja, é heresia. Se for nas artes ou nas ciências, é embuste; e se for na política, é autoritarismo puro mesmo. Jesus, como provam estas passagens do Novo Testamento, não desconheceu os que deram do seu suor antes dele. Quem somos nós, portanto, pra agir desta forma?

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